10 de abril de 2009
Por Renata Sequeira
Como dizer a uma criança que mora em um barraco para lavar as mãos antes das refeições se ela não tem pia em casa? Como explicar o aquecimento global se elas nunca saíram da comunidade onde moram? Essas são questões difíceis de serem trabalhadas, mas os educadores da Casa da Arte de Educar desenvolveram uma metodologia de ensino voltada para alunos do Ensino Fundamental que moram em áreas de baixa renda. O resultado desse trabalho, que une o ensino formal com práticas comunitárias, é o caderno “Arte de Educar – Meio ambiente” disponível na internet.
O caderno recebeu o selo de aprovação do Ministério da Educação e Cultura (MEC) e apresenta uma nova perspectiva de educação não-formal (ongs, projetos sociais e museus, o formal são as escola e as universidades), que a casa já desenvolve a alguns anos na Mangueira e no Morro dos Macacos nas atividades realizadas pelo Núcleo de Educação para Ciências.
“Nós criamos uma metodologia de ação que concilia os saberes do dia a dia, que não vieram da academia, com aqueles aprendidos na escola. Queremos que a criança dê sentido ao que aprenderam na escola e consiga relacioná-los com o cotidiano delas. A escola deve se tornar algo interessante para elas”, explica Sueli de Lima, coordenadora geral da ong.
O material exemplifica práticas que podem ser utilizadas em outras comunidades, como uma pesquisa de campo, onde os alunos identificam problemas ambientais e são incentivados a pensarem soluções para os problemas do dia a dia como também a valorizar os saberes locais.
“Queremos estimular a curiosidade e desejo dos jovens de aprender. Enfocamos a disciplina Ciência, pois ela pode englobar todas as outras matérias e a partir daí vamos mostrando que dentro da realidade deles existe muita ciência como um morador que improvisa um telhado de garrafa pet”, explica Leandra Laurentino, professora de Biologia.
Outra atividade sugerida pelo caderno são as rodas de conversa e são os próprios alunos que trazem os temas que serão debatidos. “Percebemos que o interesse principal dessas conversas gira em torno da violência. Procuramos não fazer julgamento de valor porque essa situação é próxima da realidade delas. Muitos têm parentes no tráfico de drogas. São nessas oportunidades que abordamos assuntos como Estatuto da Criança e do Adolescente, direitos e deveres, drogas e gravidez precoce”, exemplifica.
Os alunos das duas Casas – Mangueira e Vila Isabel – participaram ativamente da elaboração do caderno. Eles identificaram pessoas que fazem algum trabalho interessante na comunidade e puderam testar na prática algumas experiências. “Nós quisemos inserir os alunos também nessa discussão. Achamos importante que eles, através da Ciência, possam pesquisar sobre a comunidade onde vivem, quem é o líder comunitário, o que faz a associação de moradores”, explica Leandra.
O material, que demorou um ano para ficar pronto, está disponível no site www.artedeeducar.org.br. O trabalho foi produzido em parceria com as escolas municipais Assis Chateaubriand, em Vila Isabel, e Uruguai, na Mangueira e o Museu de Ciências da Terra. “A parceria que temos com as escolas que os nossos alunos frequentam mostram que o índice de aprovação dos alunos chega a quase 100%. Queremos debater com a outras escolas, educadores e a sociedade para que novas propostas surjam. Educar não é apenas dar aula, mas é produzir reflexão e trocar conhecimento”, explica Sueli.
A Casa da Arte de Educar funciona há dez anos na Mangueira e há seis no Morro dos Macacos. As atividades oferecidas pelos dois espaços se baseiam no Diálogo com a Escola (nova nomenclatura para o reforço escolar). Além das aulas de todas as disciplinas, as crianças aprendem informática, música (coral e percussão), fotografia, capoeira e dança. À noite funciona a alfabetização para adultos. “Aqui no Morro dos Macacos são 160 alunos nos turnos manhã, tarde e noite”, explica Arlete da Silva, coordenadora da Casa de Vila Isabel.
“A Casa não funciona dentro do Morro dos Macacos, porque queremos trazer essas crianças para outros lugares. O único problema é quando tem tiroteio e alguns alunos acabam não vindo para as aulas ou é preciso esperar aqui para poder voltar para casa”, conta Arlete
Mãe de cinco filhos, Arlete se sente “mãezona” de todos os alunos. “Alguns começaram pequenos e trouxeram amigos, primos. As Casas privilegiam os moradores das áreas atendidas. Muitos professores vieram do morro e promovem uma parceria afiada com universitários que não são moradores dessas áreas”, comemora.
Esta matéria foi extraída integralmente do site do Viva Favela. Para mais informações, acesse: http://novo.vivafavela.com.br/publique/
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