O Livro dos Abraços

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23 de novembro de 2015

A arte para as crianças
 

Ela estava sentada numa cadeira alia, na frente de um prato de sopa que chegava à altura de seus olhos. Tinha o nariz enrugado e os dentes apertados e os braços cruzados. A mãe pediu ajuda:
Conta uma história para ela, Onélio — . Pediu — Conta, você que é escritor
E Onélio Jorge Cardoso, esgrimindo a colher de sopa, fez seu conto:
Era uma vez um passarinho que não queria comer a comidinha. O passarinho tinha o biquinho fechadinho, fechadinho, e a mamãezinha dizia: “Você vai ficar aviãozinho, passarinho, se não comer a comidinha”. Mas o passarinho não ouvia a mamãezinha e não abria o biquinho…E então a menina interrompeu:
— Que passarinho de merdinha —
opinou.

A arte das crianças

Mario Montenegro canta os contos que seus filhos lhe contam. Ele senta no chão, com seu violão, rodeado por um círculo de filhos, e essas crianças ou coelhos contam para ele a história dos setenta e oito coelhos que subiram um em cima do outro para poder beijar a girafa, ou contam a história do coelho azul que estava sozinho no meio do céu: uma estrela levou o coelho azul para passear pelo céu, e visitaram a lua, que é um grande país branco e redondo e todo cheio de buracos, e andaram girando pelo espaço, e saltaram sobre as nuvens de algodão, e depois a estrela se cansou e voltou para o país das estrelas, e o coelho voltou para o país dos coelhos, e lá comeu milho e cagou e foi dormir e sonhou que era um coelho azul que estava sozinho no meio do céu.

– Eduardo Galeano in “O livro dos abraços”.

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